Angela Davis nos fala da importância de nos permitirmos imaginar e propor novas soluções e com isso, novas possibilidades de mundo. Essa talvez seja a noção mais revolucionária ou talvez a única: a percepção de que para sequer aspirar a uma mudança profunda, é necessário antes de tudo romper com as amarras daquilo que conhecemos. O apego àquilo que já conhecemos nos impede de transformar e não coincidentemente é encorajado em nome de pretensos realismo e prudência. E como tantas coisas que interessam ao status quo, o medo do desconhecido, do novo, ganha a etiqueta de “inerente à natureza humana”, como se a excitação pelo novo ou o gosto pela aventura nunca houvessem motivado nenhum homo sapiens. Regimes autoritários são erguidos sobre idéias rígidas sobre o mundo, regimes inaceitáveis se perpetuam alimentados pela convicção de que outras possibilidades são absurdo.
Para vencer o inaceitável, é pŕeciso se permitir imaginar. Um mundo sem prisões, como Angela imaginou, um mundo sem a opressão do poder, um mundo onde corpos pertençam às pessoas que os vestem… Mas aí está outra armadilha, cuidado. A imaginação é sim incentivada pelos mecanismos que rodam essa máquina inaceitável, mas ela é reduzida ao papel de escape. Há um discurso que trata como poético e lindo e até saudavelmente necessário que as pessoas recorram à imaginação para escapar do que as cerca. Claro que isso em si não é um problema. O problema é quando tudo o que se permite é fingir enquanto a realidade permanece intacta. O inimigo pode ser disforme, mas é esperto. Porém, se sabemos para onde escapamos em nossos sonhos, sabemos onde queremos chegar. Começa daí. Bora caminhar.