A inveja ocupa um lugar curioso na nossa cultura. É um argumento coringa contra qualquer desagrado e acredita-se que tenha poderes de maldição contra seus alvos, eximindo-os da responsabilidade pelas consequências de suas escolhas. É também uma carta na manga chauvinista, na forma de mais uma teoria velha mal interpretada que encaixota a psiquê das pessoas dotadas de um genital dentro da pura inveja do outro genital. É tema constante das canções que reafirmam uma cultura de feminilidade competitiva e faz muito sentido numa cultura que atrela ideais de consumo e posse à promessa de felicidade e respeito.
Me surpreende e imediatamente depois me entedia pela previsibilidade que a inveja praticamente só não seja recorrente no discurso popular para tentar explicar a subjetividade das relações de opressão do lado do opressor. Não deve ser coincidência que mulheres tenham fama de descontroladas emotivas e péssimas motoristas quando é fato concretíssimo que são os homens que assassinam quando rejeitados e provocam a maioria esmagadora dos acidentes de trânsito. Numa sociedade como a nossa, embotada pelo conservadorismo requentado e temperado com a receita do neo-protestantismo-ultra-neo-liberal, não deve ser coincidência que estejam tentando requentar também um estigma de uma doença para atacar a vivência livre da sexualidade. Deve mesmo doer muito abafar os próprios questionamentos, racionalidade, desejos debaixo de uma caçamba de culpa e medo enquanto assiste a uma parcela do mundo fazendo o que gosta sem castigo. Dói mais que dar o cu, fica a dica.